sexta-feira, 10 de abril de 2009

O dificil parto de uma nova criação

Está dificil o parto da minha nova obra erudita "Vozes do Tempo e de Mar". Trata-se de um ciclo de canções para barítono, flauta, clarinete, saxofone alto, violoncelo, piano e sons electroacústicos, tendo como ponto de partida 5 poemas da Sophia de Mello Breyner Anderssen. Cada um dos poemas explorará uma determindada técnica de composição, já abordadas em obras anteriores, que me irá ajudar a reflectir na minha actual estética da composição erudita, que actualmente incide na fusão de todas as linguagens e técnicas que explorei até aos dias de hoje. Essas técnicas e linguagens são a heterofonia, a transformação tímbrica, a "sonoridade" do modalismo aplicada ao atonalismo e o diálogo entre os instrumentos acústicos e os sons electroacústicos.
Após este introitus, passo a citar os po0emas que estão na base e na inspiração da obra que de momento estou a compor.
1 – Horizonte Vazio
Horizonte vazio em que nada resta
Dessa fabulosa festa
Que um dia te iluminou.

As tuas linhas outrora foram fundas e vastas,
Mas hoje estão vazias e gastas
E foi o meu desejo que as gastou.

Era do pinhal verde que descia
A noite bailando em silenciosos passos,
E naquele pedaço de mar ao longe ardia
O chamamento infinito dos espaços.

Nos areais cantava a claridade,
E cada pinheiro continha
No irreprimível subir da sua linha
A explicação de toda a heroicidade.

Horizonte vazio, esqueleto do meu sonho,
Arvore morta sem fruto, em teu redor deponho
A solidão, o caos e o luto.

In Dia do Mar
Sophia de Mello Breyner Anderssen



2 – Estranha Noite
Estranha noite velada,
Sem estrelas e sem lua.
Em cuja bruma recua
Fantasma de si mesma cada imagem

Jaz em ruínas a paisagem,
A dissolução habita cada linha.
Enorme, lenta e vaga
A noite ferozmente apaga
Tudo quanto eu era e quanto eu tinha

E mais silenciosa do que um lago,
Sobre a agonia desse mundo vago,
A morte dança
E em seu redor tudo recua
Sem força e sem esperança.

Tudo o que era certo se dissolve;
O mar e a praia tudo se resolve
Na mesma solidão eterna e nua.

In Dia do Mar
Sophia de Mello Breyner Anderssen



3 – A liberdade
A liberdade que dos deuses eu esperava
Quebrou-se. As rosas que eu colhia,
Transparentes no tempo luminoso,
Morreram com o tempo que as abria.

In Tempo Dividido
Sophia de Mello Breyner Anderssen



4 – Este é o Tempo
Este é o tempo
Este é o tempo
Da selva mais obscura.

Até o ar azul se tornou grades
E a luz do sol se tornou impura

Esta é a noite
Densa de chacais
Pesada de amargura

Este é o tempo em que os homens renunciam.

In Mar Novo
Sophia de Mello Breyner Anderssen
5 – No tempo dividido
E agora ò Deuses que vos direi de mim?
Tardes inertes morrem no jardim.
Esqueci-me de vós e sem memória
Caminho nos caminhos onde o tempo
Como um monstro a si próprio devora.

In Tempo Dividido
Sophia de Mello Breyner Anderssen
Num próximo post, irei descrever mais promenores sobre esta obra.

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